Amigos Químicos

"I don't know what a better world might be, but I feel that my music helps put me on a path towards one"
É com este espírito optimista e fé inabalável no poder curativo e transformador da sua música que Jan Anderzén, estudante de artes de 26 anos de idade, encara o seu projecto multiforme Kemialliset Ystävät numa entrevista concedida à revista Wire em 2004. Os Kemialliset Ystävät ou, na sua tradução para português, Amigos Químicos, existem desde 1995 com um alinhamento de músicos em constante revolução, e são possivelmente uma das faces mais visíveis de um movimento artístico e musical finlandês que engloba grupos como Avarus (do qual Anderzén também faz parte), The Anaksimandros, ou Kuupuu, e editoras como a Fonal, a Lal Lal Lal, ou a Pohjoisten Kukkaisten Äänet.
A estética deste movimento é difícil de definir e, muito embora alguns críticos já o tenham tentado aproximar e enraizar no Free Folk americano ou New Weird America, a verdade é que ambos nasceram sensivelmente pela mesma altura, razão pela qual não se pode afirmar qualquer tipo de precedência de um em relação ao outro. A catalogação num género musical da cena finlandesa tem sido um outro aspecto que faz crescer cabelos brancos nos crânios dos críticos já que o espectro de influências destes grupos no geral, e de Kemialliset Ystävät em particular é extenso e passa pelo Krautrock, Hip-Hop, Noise, Free Jazz e, claro está, pelo Psicadelismo.
Curioso será notar que embora este conglomerado de músicos contemporâneos pareça ter surgido subitamente, vindo do nada como um Big Bang musical de epicentro nordestino, a verdade é que estes se encontram posicionados num continuum desenvolvimental cujas origens remontam ao underground finlandês dos anos 60, onde pontificavam figuras como Erkki Kurenniemi e os seus experimentos electroacústicos, Pekka Airaksinen e os The Sperm, ou mesmo MA Numminen, autor de um dos primeiros discos DIY em 1961.

Podemos situar os Kemialliset Ystävät precisamente nesta esteira de experimentalismo, autonomia em relação a forças externas como as editoras, e exploração dos recônditos da mente humana através do som, da pintura e da performance. Com efeito, praticamente todos os álbuns editados por Anderzén são um convite à projecção, como se de lâminas de um teste de Rorschach se tratassem. As capas dos discos traduzem o gosto de Anderzén pela arte folclórica, as pinturas pré-históricas, a fotografia, as mandalas e as colagens, e por vezes não chegam mesmo a fazer qualquer referência ao nome do artista ou do registo discográfico. Quando existem, os livrinhos que acompanham os discos seguem o mesmo trilho, já que os nomes das faixas e informações adicionais encontram-se em finlandês, pelo que apenas podemos imaginar ou sonhar o que raio estará ali escrito. Por último o conteúdo sonoro deste aparato projectivo. Das guitarras e sintetizadores aos instrumentos tradicionais e de fabrico caseiro, passando pelos tachos, panelas e brinquedos, tudo parece ser válido para estes amigos químicos. O trabalho de estúdio assume um lugar de destaque, já que o tratamento que Anderzén imprime às gravações torna muitas vezes imperceptível a fonte original do som. O processo de composição assemelha-se assim ao laborioso trabalho de costura de uma manta de retalhos e revela de forma inequívoca o sincretismo exponencialmente idiossincrático de Anderzén.


No dia 20 de Novembro o Laboratorio Chimico convidou o auditório a mergulhar no microcosmos sonoro de Kemialliset Ystävät.

Todas as imagens que aqui reproduzimos foram retiradas daqui

Entrevista com Jan Anderzén, aqui

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