Em 1967, Kenneth Anger, que vivia e bebia nessa época a atmosfera do bairro de Haight Ashbury, em São Francisco, e que começava a preparar um novo projecto cinematográfico, “Lucifer Rising”, foi assistir a um concerto da banda psicadélica The Orkustra e ali reconheceu aquele que procurava. Certamente encantado pela aura resplandecente do guitarrista, Bobby Beausoleil, dirigiu-se-lhe no fim da performance e exclamou: “Tu és Lúcifer!” Contrariamente ao que transmite a cultura popular de tradição cristã, a etimologia e a história das religiões esclarece que Lúcifer é o “portador da luz”, uma divindade luminosa na antiguidade clássica, a estrela da manhã para os que se orientavam pelos astros ou, numa interpretação gnóstica, aquele que revelou o verdadeiro conhecimento aos homens, denunciando as ilusões do Demiurgo, o falso deus. No cruzamento inter-mitológico esotérico de tradição crowleiana, Lúcifer, o príncipe da aurora dourada, é por vezes associado ao deus egípcio Hórus, uma divindade solar que teria revelado ao próprio Aleister Crowley um novo tempo, uma nova era, o Aión do Aquário, uma época de paz e conhecimento de que ele haveria de ser o profeta.
Invocation Of My Demon Brother
Enviado por riton23 - Veja filmes em destaque e emissoras de televisão inteiras
Anger, um discípulo convicto de Crowley, preparava então, no final dos anos 60, um hino fílmico à ascensão de Lúcifer, ao nascimento de uma nova idade cósmica, invocado por Ísis, Osíris, Lilith (desempenhada pela célebre Marianne Faithful), pelo Adeptus de Lúcifer e pelo Magus (representado pelo próprio Kenneth). Bobby Beausoleil começara por ser o Lúcifer do filme e também o compositor da banda sonora do filme que preparava juntamente com a sua nova banda The Magickal Powerhouse of Oz – já que, entretanto os The Orkustra tinham acabado. Um desentendimento entre esses dois espíritos solares – Anger e Beausoleil – impediu não só a continuação do projecto como provocou o desaparecimento misterioso de algumas bobinas do filme. Anger acusou Beausoleil de as ter roubado e enterrado no deserto e decidiu acabar com a sua actividade artística, emigrando para a Europa e escrevendo um obituário no Village Voice. Em Inglaterra, encontra os Rolling Stones e gera uma amizade com Mick Jagger que inspirou mais tarde “Sympathy for the Devil” e permitiu a colaboração do músico num projecto alternativo de Kenneth Anger, “Invocation of my Demon Brother”(1969), onde foi usado o material que sobreviveu das filmagens feitas em São Francisco, numa montagem rápida, frenética e alucinadamente m(h)istérica que, juntamente com a banda sonora feita no sintetizador Moog por Jagger, cria uma obra-prima do cinema experimental e de vanguarda da época psicadélica.
Entretanto, de regresso à Califórnia, Anger retoma o projecto de “Lucifer Rising” e encomenda a banda sonora ao famoso guitarrista dos Led Zeppelin, Jimmy Page, o dono do castelo escocês que outrora pertencera ao próprio Crowley. Enquanto em pouco tempo, Crowley filma nos carismáticos lugares de Luxor, Karnak ou Stonehenge, Jimmy Page demora mais de três anos para apresentar vinte e tal minutos de monótonos “drones” que desagradam a Anger e que o descarta do projecto, acusando-o ainda de ele estar demasiado dependente da “Dama Branca” para produzir algo de válido artisticamente. Kenneth Anger reconcilia-se com Bobby Beausoleil que entretanto havia sido preso por ter assassinado um dealer e por se ter associado à família Manson e que, não obstante, reintegra o projecto da banda sonora, a qual foi composta e gravada integralmente na prisão de Tracy, na Califórnia, com a colaboração de outros prisioneiros – The Freedom Orchestra, o agrupamento que completou a versão definitiva da banda sonora de um filme que apenas se tornaria público em 1980, quase 14 anos após as primeiras filmagens.
O filme é uma média-metragem de 28 minutos, com uma montagem ainda delirante mas bem mais subtil do que a de “Invocation of my Demon Brother”. O tom da composição é bastante onírico e joga sobretudo com as forças simbólica e arquetipal das imagens. Os movimentos majestáticos, quase solenes, das figuras mitológicas, nos cenários colossais do Egipto, acompanham o ritmo evocativo das forças da natureza: o curso lento da lava vulcânica, a subida das águas do rio movidas pelo inelutável magnetismo dos astros, a interrupção do dia pela cópula cósmica de um eclipse ou o eclodir de um ovo de crocodilo…
Para ver o filme todo: no google video
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Anger, um discípulo convicto de Crowley, preparava então, no final dos anos 60, um hino fílmico à ascensão de Lúcifer, ao nascimento de uma nova idade cósmica, invocado por Ísis, Osíris, Lilith (desempenhada pela célebre Marianne Faithful), pelo Adeptus de Lúcifer e pelo Magus (representado pelo próprio Kenneth). Bobby Beausoleil começara por ser o Lúcifer do filme e também o compositor da banda sonora do filme que preparava juntamente com a sua nova banda The Magickal Powerhouse of Oz – já que, entretanto os The Orkustra tinham acabado. Um desentendimento entre esses dois espíritos solares – Anger e Beausoleil – impediu não só a continuação do projecto como provocou o desaparecimento misterioso de algumas bobinas do filme. Anger acusou Beausoleil de as ter roubado e enterrado no deserto e decidiu acabar com a sua actividade artística, emigrando para a Europa e escrevendo um obituário no Village Voice. Em Inglaterra, encontra os Rolling Stones e gera uma amizade com Mick Jagger que inspirou mais tarde “Sympathy for the Devil” e permitiu a colaboração do músico num projecto alternativo de Kenneth Anger, “Invocation of my Demon Brother”(1969), onde foi usado o material que sobreviveu das filmagens feitas em São Francisco, numa montagem rápida, frenética e alucinadamente m(h)istérica que, juntamente com a banda sonora feita no sintetizador Moog por Jagger, cria uma obra-prima do cinema experimental e de vanguarda da época psicadélica.
Entretanto, de regresso à Califórnia, Anger retoma o projecto de “Lucifer Rising” e encomenda a banda sonora ao famoso guitarrista dos Led Zeppelin, Jimmy Page, o dono do castelo escocês que outrora pertencera ao próprio Crowley. Enquanto em pouco tempo, Crowley filma nos carismáticos lugares de Luxor, Karnak ou Stonehenge, Jimmy Page demora mais de três anos para apresentar vinte e tal minutos de monótonos “drones” que desagradam a Anger e que o descarta do projecto, acusando-o ainda de ele estar demasiado dependente da “Dama Branca” para produzir algo de válido artisticamente. Kenneth Anger reconcilia-se com Bobby Beausoleil que entretanto havia sido preso por ter assassinado um dealer e por se ter associado à família Manson e que, não obstante, reintegra o projecto da banda sonora, a qual foi composta e gravada integralmente na prisão de Tracy, na Califórnia, com a colaboração de outros prisioneiros – The Freedom Orchestra, o agrupamento que completou a versão definitiva da banda sonora de um filme que apenas se tornaria público em 1980, quase 14 anos após as primeiras filmagens.
O filme é uma média-metragem de 28 minutos, com uma montagem ainda delirante mas bem mais subtil do que a de “Invocation of my Demon Brother”. O tom da composição é bastante onírico e joga sobretudo com as forças simbólica e arquetipal das imagens. Os movimentos majestáticos, quase solenes, das figuras mitológicas, nos cenários colossais do Egipto, acompanham o ritmo evocativo das forças da natureza: o curso lento da lava vulcânica, a subida das águas do rio movidas pelo inelutável magnetismo dos astros, a interrupção do dia pela cópula cósmica de um eclipse ou o eclodir de um ovo de crocodilo…
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