12*Voltei-me para ver de quem era a voz que me falava. E, ao voltar-me, vi sete candelabros de ouro; 13*no meio dos candelabros, vi alguém com aparência humana; estava vestido de uma túnica comprida até aos pés e cingido com um cinto de ouro em torno do peito; 14*a sua cabeça e os seus cabelos eram brancos, como a brancura da lã e da neve; os seus olhos eram como uma chama de fogo; 15*os seus pés assemelhavam-se ao bronze incandescente numa forja, e a sua voz era como o rumor de águas caudalosas; 16*Ele tinha na mão direita sete estrelas e da sua boca saía uma aguda espada de dois gumes; o seu rosto era como o Sol resplandecente com toda a sua força.
17*Ao vê-lo, caí como morto, a seus pés. Mas Ele colocou a mão direita sobre mim, dizendo: «Não tenhas medo!
Eu sou o Primeiro e o Último;
18*aquele que vive.
Estive morto; mas, como vês, estou vivo
pelos séculos dos séculos
e tenho as chaves da Morte e do Abismo!”
(Apocalipse, 1: 10-18)
Esta visão descrita no primeiro capítulo do último livro da Bíblia cristã, o Apocalipse, introduz uma série de revelações dadas em imagens maravilhosas a João de Patmos, o autor do livro. Tais imagens, visões simbólicas de uma verdade invisível, assumem formas múltiplas, de bestas miríficas e por vezes paradoxais que constituem no fundo os vários aspectos de uma só revelação e que é, na verdade, a de todo o Apocalipse. A etimologia e o significado da palavra grega é, de facto, levantar o véu, mostrar o que estava escondido, revelar, manifestar o invisível. E, por isso, são tão frequentes e insistentes as metáforas da luz, a iluminação, os candelabros, os olhos multiplicados que reforçam a intensidade da visão e do seu poder gnóstico, mas também a imagem dos sete selos quebrados que permitem abrir o livro escrito nas duas faces, que contém o verdadeiro saber, mantido secreto, sigiloso, para só agora ser revelado àqueles que foram escolhidos como mensageiros. A mensagem apocalíptica deste livro anuncia o fim de uma era, a do poder temporal, que será substituído pelo poder da graça espiritual e divina, mas terá sido o carácter de “apocalipsis eschaton” – revelação do fim de uma era – que terá transmitido à nossa cultura a ideia a que nos habituámos de um apocalipse como fim do mundo. E com evidência as imagens violentas de destruição e de cataclismo reforçaram esse sentido de Armagedão que para sempre lhe ficou associado, alimentando o terror de seitas milenaristas e servindo a retórica dos pregadores. Há porém muitos outros textos da tradição apocalíptica – tanto hebraica como copta - onde essa atmosfera catastrófica não é tão ostensiva ou está mesmo ausente. No entanto, em todos existem visões maravilhosas, anjos – criaturas intermédias que sensificam a palavra inefável de Deus – ou bestas impossíveis que representam conflitos interiores, sociais ou políticos. E é, pois, este recurso prolífico da figuração hiperbólica, das mensagens cifradas e de uma linguagem que revela um conhecimento esotérico apenas acessível a alguns, mas sempre com uma virtude libertadora e soteriológica – de salvação do espírito -, que caracteriza os apocalipses. Eles mostram visões do divino, tornando clara e manifesta a presença de Deus, algo próximo da enteogénese, com a diferença fundamental que a experiência do apocalipse é uma experiência literária, gnóstica, ainda que possa ser o resultado de uma experiência mística efectiva.
Tais escritos inspiraram ao longo de todos estes séculos muitos autores mas também artistas e músicos. Para ilustrar musicalmente esta crónica, escolheu-se a leitura electrónica em cinco andamentos do próprio texto bíblico, elaborada pelo demiurgo da música concreta, Pierre Henry, em 1968, com a narração feita pelo actor Jean Negroni. Editada inicialmente em 3 LP’s pela Prospective 21eme siècle, foi reeditada em CD pela Mantra Records e, mais recentemente, pela Philips. Do primeiro tempo, ouvimos ainda em fundo a abertura com o título muito revelador de “Titre-Revélation” em que João de Patmos apresenta o livro que está a escrever. Logo de seguida ouvimos a primeira faixa do 2º tempo, correspondente às primeiras aflições, ao Sétimo Selo e às sete trombetas, no momento em que aparecem os famosos quatro cavaleiros do Apocalipse. Do Terceiro Tempo – sobre os Sete Sinais – ouviu-se a descrição electro-acústica da Besta da Terra e, por fim, do quinto e último tempo, foi a vez da Babilónia, a Grande Prostituta, que simbolizava segundo algumas interpretações o Império Romano, mas que de forma mais geral e agostiniana pode significar a cidade dos homens, aquela que é governada pelo pecado, pela luxúria e pelo orgulho dos homens.
Tais escritos inspiraram ao longo de todos estes séculos muitos autores mas também artistas e músicos. Para ilustrar musicalmente esta crónica, escolheu-se a leitura electrónica em cinco andamentos do próprio texto bíblico, elaborada pelo demiurgo da música concreta, Pierre Henry, em 1968, com a narração feita pelo actor Jean Negroni. Editada inicialmente em 3 LP’s pela Prospective 21eme siècle, foi reeditada em CD pela Mantra Records e, mais recentemente, pela Philips. Do primeiro tempo, ouvimos ainda em fundo a abertura com o título muito revelador de “Titre-Revélation” em que João de Patmos apresenta o livro que está a escrever. Logo de seguida ouvimos a primeira faixa do 2º tempo, correspondente às primeiras aflições, ao Sétimo Selo e às sete trombetas, no momento em que aparecem os famosos quatro cavaleiros do Apocalipse. Do Terceiro Tempo – sobre os Sete Sinais – ouviu-se a descrição electro-acústica da Besta da Terra e, por fim, do quinto e último tempo, foi a vez da Babilónia, a Grande Prostituta, que simbolizava segundo algumas interpretações o Império Romano, mas que de forma mais geral e agostiniana pode significar a cidade dos homens, aquela que é governada pelo pecado, pela luxúria e pelo orgulho dos homens.
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