Friendsound ou Joyride?

Friendsound ou Joyride? ... Joyride ou Friendsound? ... Quem olhar para a capa do disco que se destaca aqui no Pulsar Ciclotímico do Amola-Tesouras terá alguma dificuldade em perceber qual o nome da banda e qual o nome do álbum. Regressamos pois à obscuridade. Mas, não obstante se tratar de uma banda obscura, existe, surpreendentemente, alguma informação disponível sobre os Friendsound. Não é porém graças aos membros da banda, que parecem querer mantê-la oculta, mas antes à custa de salteadores persistentes destes tesouros escondidos do psicadelismo norte americano. Friendsound foi a face oculta de uma parte significativa dos membros de Paul Revere and the Raiders, um famoso grupo de rock, nos anos 60, que permaneceu durante muito tempo no American Top 40. Em 1968, Phil Volk, Drake Levin e Mike Smith, todos membros dos Raiders, decidem formar outra banda, juntamente com o organista Ron Collins, chamada The Brotherhood, grupo mais ousado do que o anterior. E foi no contexto desta experiência, em 1969, que surge Friendsound, num dia em que uma série de amigos decidiram juntar-se, convidando outros mais, ligados à preparação de um primeiro álbum, para fazer uma “jam session” onde tudo era permitido, num estúdio com muito LSD disponível para todos. Está assim explicado o nome da banda. Quanto ao nome do álbum também será fácil perceber, numa observação mais atenta da capa do disco, editado na RCA Victor Records, onde sobressai uma carruagem psicadélica puxada por um leão, prenunciando esse passeio jubiloso, que para alguns antecipa em alguns anos as aventuras do space rock dos anos 70 e mesmo do kraut. O disco destaca-se ainda pelo seu carácter experimental, usando e abusando de efeitos de estúdio, que enfatizam o contexto psicadélico do álbum, mas também pelo facto de recorrerem a muitas gravações de campo, nomeadamente, sons de crianças em jardins infantis, pássaros, preterindo assim, em muitos momentos, a tentação melódica e rítmica que o passado destes músicos tornava muito real.


Quatro faixas compõem o lado A e apenas duas mais longas, o lado B deste LP relativamente curto. “Joyride”, a primeira faixa, não permite duvidar das intenções alucinogénias, ao sobrepor camadas de gravações que dissolvem a unidade do tempo e do espaço acústico, enevoando a consciência para a transportar até um paraíso artificial, onde a flauta liquefeita de Don Nelson se dilui com as guitarras sensuais de Drake Levin e Chris Brooks, acompanhadas pelo órgão planante de Ron Collins. Uma cacofonia de sabor industrial enterra nostalgicamente a infância para sempre perdida, em “Childhood’s End”, tentando recuperá-la num efusivo hino às guitarras distorcidas do rock. A nostalgia revela-se logo de seguida, com “Love Sketch”, uma balada sentimental mas ainda cheia de reverberação. Como uma experiência de música concreta, “Childsong” devolve a experiência inocente do canto dos pássaros, dos xilofones de criança e das caixas de música, envolvidas pela rememoração sonora de um recreio de escola. O lado B reserva-nos porém ainda as longas derivas psicadélicas, primeiro com “Lost Angel Proper St.” e depois com “Empire of light”. Não há luzes estroboscópicas mas os efeitos de estúdio usados sem discrição fazem-nos reviver, sinestesicamente, a experiência de um carrossel peristáltico que dificulta a digestão de uma grande dose de mescalina numa cidade colorida de néons. A deixa perfeita para um império de luz que nos faz visitar coercivamente uma casa assombrada, nesse parque de atracções onde a adrenalina se mistura com outros humores lisérgicos. Mas esta experiência fúngica só pode ser comprovada, escutando “Lost Angel Proper St.”, depois de se ter escutado “Joyride”.


Tracklist:

Lado A

1 Joyride - 4:15
2 Childhood's End - 3:26
3 Love Sketch - 3:26
4 Childsong - 6:12

Lado B

1 Lost Angel Proper St. - 9:22
2 Empire of Light - 9:40

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