Mr. Suehiro Maruo’s Freakshow


Midori, shoujo tsubaki, a menina das camélias, pertencia a uma família pobre. O pai, endividado pelas dívidas do jogo, abandonou o lar e Midori, para ajudar a mãe doente, vendia flores nas ruas de Tokyo dos anos 20. Mas entretanto a mãe faleceu, deixando-a órfã e perdida num mundo cruel, do qual parecia ter sido resgatada quando um homem de chapéu de coco lhe propôs um trabalho no meio dos artistas. Porém, a desafortunada rapariga cedo descobriu que havia sido enganada e que se tornara simplesmente numa criada permanentemente maltratada por todos no circo de aberrações do senhor Arashi. Gigantes engolidores de espadas, anões desmembrados, hermafroditas e homens desfigurados de cabeça enfaixada povoavam os dias miseráveis de Midori, assediando-a, humilhando-a, tornando a sua vida tão infernal que preferia a morte. Até que um dia apareceu um novo personagem, Masamitsu, o carismático anão contorcionista que realizava o prodígio de se enfiar completamente num boião de vidro. Com o seu penetrante olhar, seduziu Midori e mostrou-se como o seu protector, impedindo que maltratassem a sua querida assistente. Frágil e sem outra esperança, Midori agarrou-se a ele revelando um sorriso que há muito havia perdido. Mas também Masamitsu tinha um lado obscuro e perturbador.


Esta história, posta em banda-desenhada, pelo já famoso Suehiro Maruo, inspira-se num antigo kami shibai, ou seja, um espectáculo tradicional que ocorria em feiras de rua, onde um contador de histórias se socorria de cartões com desenhos fantásticos para ilustrar as suas narrativas efabuladas, em cujo verso estavam por vezes escritas legendas relativas à imagem, que eram vendidas posteriormente aos que haviam ficado fascinados com aqueles contos cheios de drama e crueldade. Suehiro Maruo cruzou esta referência do Japão tradicional e do subgénero do muzan-e – gravuras que representavam atrocidades - com a estética do expressionismo alemão, fazendo jus à sua inspiração gótica de juventude. Na verdade, o trabalho de Suehiro Maruo sempre foi assombrado por esses autores mais obscuros como o Marquês de Sade, Edgar Allan Poe, Baudelaire ou Georges Bataille, onde o erótico e o grotesco sempre vão de mãos dadas para explorar as mais negras paixões da humanidade. Aliás, as suas obras são conotadas normalmente com o ero-guro, movimento literário e artístico dos anos 20/30 que se focava na violência, no erotismo e no grotesco e que aliava a tradição dos artistas shunga como Yoshitoshi com o imaginário decadente da república de Weimar.



Midori foi ainda adaptado para o cinema de animação por Hiroshi Harada, um renegado da indústria de animação japonesa, tal como Maruo havia sido no início pelas revistas de shonen manga. Rejeitado por inúmeros estúdios, decidiu gastar as suas poupanças numa produção independente, com a consultadoria artística do próprio Maruo e a ajuda de várias figuras do underground japonês, para realizar um filme que não teve distribuição comercial no Japão. Com efeito, as projecções do filme no Japão, a partir de 1992 – ano da sua conclusão – existiram apenas em circunstâncias bastante obscuras, fomentadas pelo próprio Harada que divulgava cripticamente o filme e a sua projecção, deixando pistas sobre a ocasião e o local para os que conseguissem encontrar poderem assistir ao filme, rodeados por um ambiente de cabaret e freakshow. A banda sonora foi composta nada mais nada menos que pelo não menos estranho J. A. Seazer, habitué da cena psicadélica e experimental japonesa, membro dos Tokyo Kid Brothers e da companhia de teatro de Shuji Terayama para a qual fez inúmeras composições.

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